Alimento quente por 1 real
Voltando aos 12 anos, de posse das revistas, salgados e dois maços de kirby branco, subi no 423 - Tinguá X Pavuna. Sentei em um dos bancos altos da traseira. Com uma visão mais ampla, conseguia perceber os detalhes do cotidiano que acontecia dentro do ônibus.
LIVROS
Descritor;
6/24/202515 min read


Bem, aqui estou novamente. Após equilibrar o monitor com sete livros velhos, achar a música perfeita, pôr o ventilador na direção exata da brisa que entra pela janela. Realizar alguns movimentos de yoga — só para garantir que o incômodo abdominal não é um órgão prestes a romper.
— Se faço yoga e não dói, seja o que for, logo passa.
Ajustes feitos, recordo o questionamento pertinente: Por que ainda não escrevi sobre o que preciso?
Eu sei, posso e quero fazer. Mas… não faço; isso começou quando eu andava com os de preto, ouvindo rock alternativo fumava e bebia, e, aos quase doze, já pagava pelos meus custos. Por isso não aceitava que ditassem minha vida — a resposta era a mesma para qualquer adulto que ousasse me julgar, por ter deixado a escola antes da quinta série.
Repetia eu - “Trabalho, pago o aluguel e compro comida
Isso inibia a continuidade da conversa - era isso ou fome e desabrigo. Ao ver a situação, se afastam como quem sai de perto de um cheiro desagradável, desejando dias melhores.
Por ter nascido nessa condição, sem perceber, me habituei a ser criança com responsabilidades de adulto.
Lúcia, minha mãe, em uma tentativa escabrosa, comentava como quem soube educar: Aos 11, ele já sabe de tudo sobre a vida - sorria com a tristeza de quem teve que aceitar a derrota - e confirmava ao fato lembrando que aos 8 eu já comprava o pão com o que ganhava na feira às sextas.
Em todos os trabalhos e o destino do dinheiro era o mesmo - aluguel, luz, comida e água.
Quando sobrava uns 30 reais, gastava com prazeres rápidos — daqueles que dopam o jovem classe C. E na Pavuna, era escancarado: Salgado, maconha e pornografia de fácil acesso monetário.
Próximo ao cine erótico. Em uma esquina havia uma banca de revistas, mas ali nada de Hermes ou Avon, eram publicações obscenas e usadas.
Um pequeno cartaz anunciava.
‘Pornografia de segunda mão em bom estado de conservação.’
Estamos na mesma época em que a Rede Bandeirantes, exibia o cine privê nas madrugadas, com títulos que por vezes beiravam a pornochada:
Emanuele do Espaço - Um Tesão do Outro Mundo.
Ano 2169, a nave Orgastrom 7 sofre uma pane no sistema de aquecimento e começa a congelar no meio do espaço. Sem chance de resgate, os quatro tripulantes sabem que a única forma de gerar calor para se manterem vivos até o destino, é o sexo.
Emanuele, a comandante, é pura luxúria cósmica, e ao lado do galã Max Vulcano, e, da corpulenta e elegante Dra. Nádia Kroks, que é assistente do musculoso nerd Dr. kulk Jhon, conduz a todos por uma jornada de prazer interestelar.
No espaço, ninguém ouve seu gemido... mas todo mundo sente o calor.
Era o Slogam para o sexo em gravidade 0.
- Não fazia sentido ver isso.
Nos dias de pagamento, eu ia pra banca. O dono, com seu boné cinza e olhar sisudo, me olhava como uma perturbação temporária.
"Mais um moleque pobre atrás de pornografia barata."
Eu era isso mesmo.
Além das revistas existia a pasta preta com capas de pôrno em VHS - espiava abrindo só de lado, para que não estivesse à vista de quem passava, pois os títulos eram quentes e marcantes:
Donas de Casa de Nilópolis: Suor, Sabão e Safadeza
Bonde das Tigresas Sentadoras: Cio na Floresta da Tijuca
Minha Tia Conheceu um Cara e Eu Fiz 18 — Alugue!
Detalhe: eu nem tinha videocassete.
Escolhia as 3 revistas, com menos sinais de uso, pagava os
R$ 10,00 e punha na sacola junto com alguns salgados, que comprei e uma carrocinha perto do Sesc Meriti. Naquele tempo eu não sabia, mas aos 14 conheci: A lenda pavunense — que por questões de economia, fritavam os salgados de um real em óleo diesel.
Rock e Frituras
Conheci a cozinha que fabricava esses salgados ao trabalhar
em um fliperama na Pavuna e precisei de fornecedores.
Indicaram Dona Mirna - é barato e não atrasa.
Fui até a antiga rodoviária, em frente a um valão podre que fedia ainda mais nos dias de sol. Após o portão da chapa, era intenso e pesado o odor de gordura quente. Lonas amarradas em tábuas, calor forte, rostos suados. Havia ali uma fina camada de farinha em tudo.
A coxinha fervia num caldo escuro e denso. Um desconforto geral; panos cobrindo bacias, olhares atravessados. Eu não devia ver aquilo.
Negociei com Dona Mirna. Na volta, vi as carrocinhas enfileiradas, as mesmas que circulavam por São João de Meriti distribuindo salgado
com suco a R$ 1,00 ( uma moedinha) — quente e acessível. O suco parecia laranja.
A moda era o Pastel Chinês de Frango Catupiry — só uma pasta branca indecifrável.
- Não sei se realmente usaram óleo diesel para fritar, ou mesmo se isso é possível. Talvez nunca saiba se a lenda é verdade ou não.
Voltando aos 12 anos, de posse das revistas, salgados e dois maços de kirby branco, subi no 423 - Tinguá X Pavuna. Sentei em um dos bancos altos da traseira. Com uma visão mais ampla, conseguia perceber os detalhes do cotidiano que acontecia dentro do ônibus.
Foi assim, do alto, que eu a vi em pé segurando na barra do ônibus, havia lugares vazios, mas ela não queria sentar. Parecia querer olhar pelas janelas, tinha um olhar apreensivo e fixo. Parecia ter 18 anos, usava um vestido verde com mangas longas e altura que cobria até os pés. Cabelo castanho cacheado preso com uma bolsa preta; Indo para casa do romance proibido, que os pais religiosos nunca aprovariam por não pertencer à igreja.
O Encontro casual.
Foi no curso de inglês, em frente a igreja da matriz que Rebeca conheceu Matheus. E como se o destino quisesse uni-los naquela pequena sala comercial, com pequenas infiltrações cinzas no teto antigo e amarelado, se sentaram lado a lado, abaixo do ventilador de teto. E pela proximidade casual viraram dupla para exercícios de dicção. Um deles consiste em ouvir e corrigir a pronúncia do colega, que por consequência precisa ter muita atenção ao modo do que é dito, e assim pode apontar as correções. Nesses casos, é preciso atenção a boca de quem fala.
Mateus, com seu modo calmo e passivo, mesmo após o primeiro mês não conseguia se aproximar de Rebeca, que além do modo contido e baixo de falar, o respondia somente o essencial. Nunca perguntava nada, só respondia. A aparência é os modos tímidos de Rebeca confirmavam sua rígida religião que exigia roupas fechadas, e assim, ela se vestia com devoção e castidade - “até o pé.”
E sem maquiagem e adornos, Rebeca existia de forma controlada, seguindo todos os ditames da versão do cristianismo que lhe foi determinada ao nascer.
Na semana da prova oral, o exercício de dicção foi intensificado. Tinham ali 3hs de olhares trocados. Matheus animado, virou a cadeira em direção a Rebeca, e ao sentar leu Isaque na pequena amarelada do nokia 1120 de Rebeca em um desconfortável virou a tela para baixo.
- Quer começar?
- Posso.
Enquanto Rebeca repetia as palavras que cairiam na prova, Mateus olha fixo para sua boca em dado momento, os olhares se encontram e, um pequeno sorriso surge entre ambos seguido de um olhar intenso. Mateus percebeu ali a chance que esperava.
Isaque volta a ligar. E como alguém que se livra de um incômodo, Rebeca põe na bolsa o telefone.
Agora é Mateus e quem fala, e a primeira coisa que diz é:
"I’d love to take you out."
Eu adoraria te levar para sair.
Rebeca, que pela primeira vez pode conhecer livremente alguém “do mundo”. Se sente enamorada, e sem saber ao certo o que dizer - sorri abaixando os olhos, - em seguida - levanta o rosto com uma tímida afirmativa com a cabeça. E pede baixinho que anote seu número, em seu caderno. Mateus preferia ter pego o número, mas diante do gesto inesperado, entrega a ela o cartão da farmácia que trabalha como vendedor, na Penha-RJ. Rebeca guardou dentro da capa do celular, e na continuidade dos exercícios, entre um sorriso e outro ia se confirmando para ambos que estavam bem por apenas estarem pertos um do outro.
Ao final da aula, Rebeca pede baixinho, quase sussurrando perto do ouvido de Mateus, que atento ouve:
Não fala comigo fora da sala. Depois te explico.
O SMS
Naquela noite de quinta às 21:26h, Mateus recebe um sms no kitnet alugado na Vila Rosali - SJM.
Rebeca:
- Oi, antes de tudo. Por favor, nunca mande msg nem ligue. sempre eu te chamo. Minha mãe pega meu celular enquanto durmo.
Você pode fazer isso - nunca me chamar?
Mateus:
Nossa que bom você aqui. Estava agora mesmo pensando no que aconteceu hoje. Foi muito bom estar com você, te ver sorrir.
Ok, não te chamarei.
Rebeca:
Também gostei de hoje. Sempre tive vontade de conversar mais com você. Meus pais conhecem os donos do curso, por isso não posso conversar lá.
Mateus:
Tudo bem, mas ao menos, podemos por aqui agora.
Rebeca:
É. Mas agora tenho que ir. Só vim dar um oi…
Mateus:
Quero você. Me chama quando puder.
Rebeca:
Está bem. Boa noite.
Mateus:
Boa noite, Rebeca. Hoje vou dormir lembrando do seu sorriso.
Rebeca: …
Após isso ela apaga as msg e o número de Mateus, e deixa o cartão embaixo do colchão, e dorme se sentindo boba por não saber como lidar com a forma que Mateus a trata. Nunca havia sido atraída por alguém; ainda mais por ímpio.
Todos os pretendentes pré-aprovados pelo pai, pareciam almejar ser genro para se tornar familiar do famoso religioso.
A Verdadeira Fé
Rebeca é filha da promessa no:
Ministério Apenas o Nosso Deus é Verdadeiro
Venha para igreja ou vá para o inferno
São João de Meriti - RJ
Rebeca cresceu em um sistema de contenção social. Nem na escola ficou sem tutela. O colégio pertencia à igreja, o que facilitava seus pais organizarem por classe social e hierarquia da igreja as salas de aula.
O que a fez conviver somente entre as famílias que têm lugares marcados na fileira da frente da igreja.
Aos 17, quando teve a liberação do pai para namorar.
Isaque era a melhor opção, segundo o pai - o mais adequado para ela.
Por ser filho de um discípulo sem pecados; em um possível casamento a nossa família manteria a aliança entre os que aceitaram a Verdadeira Fé.
Então com mais curiosidade sobre como é namorar do que vontade de estar com Isaque. Ela já ouvira das amigas, que ele tinha interesse nela, mas como não podiam conversar sozinhos - era uma das regras de convivência da Verdadeira Fé - o pouco que conversavam era sobre assuntos do ministério. Rebeca aceitou que seu pai falasse com o pai de Isaque.
- Se intitulam como: Os Que Aceitaram A Verdadeira Fé
Os membros do Ministério Apenas o Nosso Deus é Verdadeiro que desde da sua fundação em 1942, em São João de Meriti - RJ, exige padrões rígidos de comportamento e vida social dos seus membros. Que convivem em uma pequena colônia onde o cotidiano segue o que é imposto pelo discípulo ancião: Emeris Vieira - pai de Rebeca.
Dois dias depois, no portão de casa, Rebeca se despede do primeiro namorado do com um selinho no portão. Um pouco feliz pela nova condição, naquela noite, se revira na cama, movida por pensamentos
que não deveria, mas tinha!
Isaque tocava como se fosse uma santa.
Ela esperava algo mais íntimo, que ele ao menos tentasse.
E pensava como se ouvisse a própria voz:
- ficamos sozinhos, e ele nem a mão em mim tentou passar. sempre achei ele um pouco delicado, será que gosta de mulher? - onde já se viu, ficar falando sobre a fé, na hora do pecado - Rebeca sorria com sua condenável piadinha suja. Mas estava disposta a continuar, afinal era somente o primeiro encontro. Na próxima quinta ele volta. E dormiu esperançosa que o próximo encontro fosse mais sobre eles, e não sobre o ministério.
Mas, como a vida de Rebeca em tudo que fazia, sentia a releitura dos cultos. Ao final dos encontros sentia-se mais abençoada do que apaixonada.
No quarto mês, após uma difícil conversa com Joria, sua mãe, que leva a interpelação ao pai, que diante da infelicidade da filha, na naquela noite expõe o aviso no quadro de msg do anciãos, que o laço entre Rebeca e Isaque foi rompido. E por isso ambos se encontram em período de retenção relacional, não podendo iniciar novo relacionamento, pelo período de meio ano.
Namoro esse que Isaque no terceiro mês, já chamava de noivado. O que incomodava Rebeca. Ele percebia o desinteresse dela, mas era a melhor oportunidade de avançar dentro da hierarquia da fé.
Rebeca, nos dias seguintes, distanciada do quarto, queria dar a entender para o pai, que estava em uma mistura de catarse com o jejum. O pai, que era irredutível quando se trata dos fundamentos da Verdadeira Fé, mantinha o mesmo vigor no cuidado com a filha, e ao ver Rebeca sentar-se no sofá, onde ele assistia ao Jornal Nacional, ouve atento sua filha falar sobre uma revelação divina. Rebeca fala a Emeris sobre aprender inglês, pois afirma que durante a reflexão matinal - que é o equivalente a prece cristã, com mais teatralidade - ouviu que a msg da fé, deve ser dita ao mundo.
Emeris aflora sua vaidade e como pai vivo da promessa do DEUS, romantiza na imaginação sua msg da fé conquistará o mundo. Extasiado, vê algo divino no interesse de Rebeca, e após ouvir Rebeca, o pai se convence que a imersão é o modo mais rápido para aprender o inglês, e, como é um serviço pedido pelo DEUS, precisa ser feito o quanto antes. O pai aceita e Rebeca já entregou um panfleto que pegou na caixa dos correios de um curso na praça da Matriz. Ela já vinha cultivando uma grande curiosidade sobre como é andar pelas movimentadas ruas de São João de Meriti sozinha. Tinha ali a oportunidade. Na segunda semana de Março se matriculou.
O limpinho da farmácia
Foi no mesmo mês em que Mateus alugou seu primeiro kitnet na Vila Rosali — um bairro pequeno de São João de Meriti, cortado por uma linha férrea, com casas de cores gastas e diferentes, coladas umas nas outras, formando uma cadeia horizontal de moradias humildes.
As ruas eram estreitas, com aquele tipo de iluminação típico da Baixada Fluminense: onde, por furto das lâmpadas ou defeito mesmo, uma parte ficava iluminada e a outra em penumbra.
Caminhar ali era ouvir, pelas janelas abertas, o som da novela das oito misturado a um rap lento que ecoava de fundo.
Agora, empregado aos 22, de uma rede de farmácias, com o salário mais comissão de 0,2%, como vendedor poderia pagar seu aluguel, e viver sozinho. Longe da conhecida e vida caseira.
Criado no parque Alian, tinha uma certa repulsa de morar em uma das casas que beiravam poluído e fétido rio Sarapuí.
Aos 7 anos o menino já tinha um total asco ao que parecia sujo -, sempre ganhava a estrelinha de uniforme me limpo, Mateus se orgulhava do vinco na calça escolar. Filho de pais aposentados - aos quais nunca deu muito trabalho -, em resumo: Se mantendo limpo e lendo estava satisfeito.
Cresceu interessado por vilões, super heróis, jogos e gibis, que eram todos guardados em uma caixa de acrílico o qual se orgulhava por manter o ambiente interno limpo e organizado. Seu quarto sempre impecável.
Gostava de meias brancas com sapato preto. Sua mãe o incentivava a brincar na rua, mas não era o que ele queria. Para Mateus, se manter seguro e organizado sempre foi mais importante.
Agora tinha assinado a carteira e feliz por ser CLT realizou um antigo sonho, de aprender inglês e poder ver animes sem legenda e jogar jogos sem tradução. E poder sair da casa dos pais, e assim ter a tão sonhada casa, a casa descontamina a, "descohouse", era como ele chamava.
No dia de aula
Na terça o dia estava frio e chuvoso, enquanto muitos queriam ficar em casa, Rebeca ansiava sair. Sorria escondido ao lembrar de como era fácil ficar bem ao lado de Mateus, ele não exigia nada. Ela desenvolveu com ele uma liberdade que antes nunca sentiu. Ao mesmo tempo que se sentia corrompida pelos pensamentos mais sacanas, de súbito, lembrava-se que seus pais e o próprio Deus, nunca a perdoariam.
A aula foi ótima. Ela deixou Mateus encostar na perna na dela, ele estava quente e gostou de sentir o calor.
Na saída, ainda nas escadas:
- Vamos tomar um suco,- diz Mateus para Rebeca.
Não posso, meu pai conhece muita gente.
- Mas só quero conversar.
você não iria entender - enquanto falava Rebeca - lembrava
do pai.
- Bem, - disse Mateus, titubeante - senão podemos nos encontrar em público, acho que não aceitaria, mas,
moro sozinho em Agostinho Porto. E prometendo que nada faria e se auto validava a segurança da moça dizendo: É uma avenida, se gritar o vizinho ouve - e sorrindo, esperançoso - olha para Rebeca que parece ponderar sobre e diz em seguida:
`- Na quinta faltamos o curso, e vou para sua casa. anote aqui seu endereço, estou confiando muito em você. Mateus anota o endereço, pensando: será que ela vai mesmo?
Rebeca, além de linda, se portava como uma mulher séria com fortes princípios. Somente aceitou ir na casa dele para conversar e assim não ser vista e denunciada por algum dos muitos fiéis de Emeris.
Mateus com aquela aparência farmacêutica, fresca de gel no cabelo e pele hidratada, prometeu se comportar e respeitar.
Na quarta, terminou de faxinar minuciosamente o kitnet às 22:45 e com cheiro de pinho, dormiu pensando que amanhã naquele mesmo horário, já teria encontrado Bruna. Naquela noite mal dormiu.
Na quinta, Mateus saiu do trabalho e como todo bom conquistador clt 6x1, no crédito em 2x, comprou, queijo, presunto, refri, suco, pão de forma, alguns chocolates e bombons. Era o luxo que o salário mínimo permitia.
Já Rebeca, passou a noite de quarta inquieta, pensava na cama:
- Será mesmo que devo ir?
e se me trair, se deixar ele me tocar?
- se eu perco a virgindade e papai descobre, ele me mata.
Joria a mãe
Em suas conversas maternas, entendeu que era melhor manter uma constante indiferença ao desejo, que fora do casamento, e apenas tentação da carne e por consequência, é, do demônio, por isso deve ser evitar o pensamento.
A solução para Rebeca transar, era casar. Os pais a criaram sob uma rigorosa mordaça sexual, A Mãe, Joria, ensinou à filha que viviam em uma boas condições porque eles seguiam rigidamente os ensinamentos da verdadeira fé. E que, se Rebeca usasse seu corpo para prazer, por meio dela, a família seria condenada. E, com a certeza de enviar toda a família eternamente para o inferno de brasa, fogo e dor, ela sentiu desejo de percorrer seu corpo inúmeras vezes, mas nunca se tocou.
A Visita na casa limpa
Ali, Rebeca, olhando pela janela do Belford Roxo x Pavuna - precisava tomar uma decisão: Quero ou não esperar o casamento para sentir o que apenas leio e ouço falar?
Enquanto buscava por um sinal divino que lhe conduzisse dentro da fé. Já cansada de uma vida de restrições. Não mais acredita que Deus era assim tão vingativo como lhe ensinaram.
Lembrava das grandes oscilações no relacionamento dos pais, que já foram da traição à agressão - mas sempre tudo é culpa da intensa batalha espiritual, por serem eles, escolhidos de Deus, vivendo para mostrar a todos que são filhos do dono do ouro e da prata. Nunca são eles, os culpados - sempre é o sobrenatural que os faz cometer os atos. E após isso, pedem perdão com choro e exaltação, e clamam a Deus, por não serem tão fortes quanto o salvador. Após algumas horas de jejum, se sentem perdoados e agradecem o novo perdão concebido.
Será que ela não seria perdoada por estar seguindo seu coração? Rebeca, ouvia seus pensamentos, enquanto passava por ela um camelo, com uma caixa de papelão, oferecendo 3 barras de chocolate por 10 reais, e óleo singer por 2 reais.
Enquanto isso, Mateus fazia os últimos ajustes para que a pequena kitnet fosse um ambiente limpo nos detalhes. Limpou, até o vão onde corre a janela, com a minúcia que só um homem disposto a impressionar, e transar pela primeira vez tem. Se conferiu no espelho, tudo raspado e dente escovado. O cheiro era bom.
Conferiu o banheiro pois aprendeu no Yahoo Fórum - como conquistar uma namorada. Ao receber uma mulher, ao banheiro deve ser dada a máxima atenção. É essencial estar higienizado e com um papel; importante ter sempre um papel de ótima qualidade - os mais caros.
Rebeca percebeu que faltavam apenas dois pontos para descer
- acho que devo voltar - falou baixo para si mesma. Ir sozinha para a casa de um homem que conheci há 4 meses. Onde estou com cabeça, era loucura que antes, nunca imaginei fazer. Mas agora, envolvida a esse sentimento livre e cru, desceu do ônibus, atravessou a rua, tocou a campainha da casa número 05 da avenida de casas.
Ao ouvir a campainha, Mateus, sem saber ao certo como fazer, pôs a blusa e, no corredor, tentava manter a calma - ele espera que sua virgindade não seja percebida. Ao abrir a portão, Mateus se impressiona com a beleza de Rebeca, que com olhos grandes e negros, e um contraste marcante com sua pele branca sem maquiagem. Ela abre um pequeno sorriso ao vê-lo, e entra, e Mateus sente o perfume doce e leve de Rebeca usa ao fechar o portão.
Eles agora só têm três horas, nesse primeiro encontro a sós.
Tudo era ficção? Pode ser. Ou não.
Desci no ponto da praça de Coelho da Rocha, atravessei a estação de trem. Andei por ruas sujas e molhadas entre pessoas apressadas.
Na casa da vez, vivenciava uma conhecida sensação em que, pelo menos até amanhã, tudo estava bem.
Foi assim que no sábado chuvoso e frio na Baixada Fluminense, tomei café com pastel chinês de frango com catupiry, enrolado num cobertor velho e cinza.
Me bastava.
Cigarros, TV e um filme bom às 21h.
Era esse o conforto que cabia.
E volto a pensar que preciso começar a escrever.










